maio 292017
 

Saiu o mais boletim Opinião Anarquista, Nº 8, que divulgamos hoje na Marcha da Maconha em Fortaleza. Baixe o Boletim neste link ou então leia abaixo a nossa nota.

LUTA ANTIPROIBICIONISTA

POR UMA SOCIEDADE VERDADEIRAMENTE LIVRE E AUTONÔMA!

Estamos sofrendo diversos golpes na educação. Cortes e ajustes é regra e o sucateamento e esquecimento é uma consequência inevitável. O governo Dilma não garantiu direitos e nem recursos e muito menos o governo Temer irá garantir. Nenhum governo garantirá. Só a luta muda a vida. Cotidianamente estamos sendo golpeados/as, atacados/as pelo Estado.

Luta antiproibicionista por uma sociedade verdadeiramente livre e autonôma!

É um absurdo que a lógica conservadora e proibicionista de lidar com as drogas, e portanto, que essa guerra as drogas ainda esteja em vigor no Brasil. Métodos como a velha crença na punição e no encarceramento nunca deram certo e sabemos; vejam só o superlotamento dos presidios, nós temos a 4ª maior população carcerária do mundo e 67% desses presos e presas são Negros e Negras, segundo o próprio Ministério da Justiça. Em relação à escolarização, os dados indicam que oito em cada 10 presos estudaram, no máximo, até o ensino fundamental. Com isso percebemos que é o povo pobre, preto e marginalizados que lotam os presídios, e que historicamente teve serviço sociais negados.

Já está mais do que óbvio que estes métodos não foram criados para solucionar nada, eles fazem parte de um sistema caótico de criminalização da pobreza e com ela, um controle do povo Pobre e Preto para o desfrute dos burgueses ricos, em sua maioria brancos. Mais do que um jogo entre bem e o mal, justificando a repressão de cima pra baixo, os donos do mercado mais lucrativo do mundo, o tráfico de drogas, que pode chegar a 2 Trilhões de doláres por ano e não tem nenhum interesse pela sua saúde. Não há um tipo de poder paralelo do crime, quando está se falando entre os de cima, o estado é mais do que cúmplice nessa história, o que não pode nos espantar em um mundo capitalista onde ganhar é a única regra.

A criminalização da imigração, principalmente mexicana, é um fator importante para entender o proibicionismo vindo dos Estados Unidos no século passado. A marijuana é um elemento presente na cultura camponesa na América Central e Caribe. O medo americano tinha e tem lugar na fronteira com o México, área ocupada (Baixa Califórnia) pelos anarquistas em plena revolução mexicana, em 1911. Além da guerra aos revolucionários mexicanos, depois disso a marijuana e o álcool passaram a ser proibidos nos Estados Unidos. Era a ideia de que os vícios dos latinos não poderiam chegar nos EUA.

Vendem a “erva” junto a drogas pesadas e a acusam-na de ser porta de entrada, zombam da capacidade intelectual da cultura do nosso povo e dizem que ela queima os neurônios, mentiras que a ideologia dominante prega sobre a Cannabis, vindas da hipocrisia da casa branca, ou a “casa do pó branco”, como Lorenzo Kom’boa Ervin no livro Anarquismo e Revolução Negra cita a administração política dos EUA que está por trás de todo o comércio de drogas.

Usuário não é criminoso! E ao contrário das forças policiais e dos programas policialescos, devemos diferenciar os grandes traficantes dos pequenos (os varejistas). No presídio feminino do Ceará, Auri Moura Costa, aproximadamente 60% dos casos são por conta de tráfico de drogas. As mulheres acabam ocupando postos secundários na estrutura do tráfico e passam também pela rotina de lotação. Em sua maioria, são analfabetas funcionais e “segundo dados da Pastoral Carcerária, cerca de 85% dos homens presos recebem visitas femininas, de suas companheiras, de suas namoradas, suas esposas, enquanto apenas 8% das mulheres continuam recebendo visitas”. (Informativo Fábrica de Imagens, Edição nº 9, 2012)

A polícia matou mais na guerra às drogas, do que todas as substâncias psicoativas juntas. A causa de morte aqui é ser pobre e negro, podendo ser criminalizado/a por estar com algum “bagullho” no meio da noite nas periferias ou então ser “agraciado” com um kit flagrante pela PM – kit composto por alguns materiais que tem o objetivo de incriminar os/as periféricos/as, como foi o caso do Rafael Braga, jovem negro e pobre que, em janeiro de 2016, foi preso com flagrante forjado.

Somos contra todas essas políticas conservadoras que tratam o usuário de drogas como pária a ser afastado do convívio social e induzem a representação dele como uma pessoa incapaz de fazer qualquer coisa – uma ideia de que a droga tomasse o lugar de seu cérebro e o tornasse um impensante, diante de você, o(a) sóbrio(a), capaz de tudo. Entretanto, a melhor arma que um usuário viciado pode ter é justamente a sua força de vontade, a sua autonomia, que faz ele conseguir se libertar dos hábitos impulsivos, coisa que é totalmente perdida quando, numa perspectiva disciplinadora, tentam internar de forma compulsória e autoritária os(as) dependentes. Ele(a) nunca restaurará seu equilíbrio, enquanto sua autonomia lhe for negada, pois um dependente não ficará “limpo” só porque os outros querem.

Uma legalização da maconha acompanhada de um controle estatal não traz uma autonomia para o indivíduo e a coletividade. Já temos tantas normas e controle sobre diversos produtos, mas tais legislações não garantem nenhuma qualidade. Pelo contrário, nos alimentamos diariamente com produtos transgênicos, modificados em laboratório e com adição de produtos químicos. Os processos industriais ou em laboratórios modificam a composição química do produto natural, extraído da natureza. Uma legalização via estado como querem os partidários faz com que a maconha vendida pelo governo e pelas corporações privadas seja repassada ao usuário com muitas taxas (por considerar não essencial) e um preço alto, que provoca um cenário maquiado para o esquema capitalista da maconha, pois continua-se a venda ilegal e de pouca qualidade para os (as) que não podem pagar, mantendo então todo o controle anterior, junto a uma grande arrecadação fiscal para os bolsos dos governantes e empresários.

Precisamos organizar cooperativas autônomas que preservem o ecossistema, respeitando a biodiversidade e socializando os conhecimentos sobre o cultivo e colheita. O controle das sementes naturais também é fundamental, pois podemos manter uma qualidade orgânica e um bom redutor de danos. Precisamos de uma nova relação com a terra e com a natureza. Sendo assim, somos contra a adição de produtos químicos em algumas drogas, como no cigarro (planta tabaco), na cocaína e na maconha (mesclado e prensado). Também não concordamos com a monocultura da cannabis sativa (da Maconha), pois pode gerar o desgaste do solo. Acreditamos que a policultura e a agroflorestação são meios sustentáveis para a conservação do ambiente. A prática do espiral de ervas pode ser feita, assim como um quintal produtivo com uma boa diversidade de espécies.

A luta antiproibicionista não é pauta secundária para nós anarquistas (e nem será centralizada), não tem como ser, pois toda essa guerra nos atinge diariamente enquanto povo oprimido.

O antiproibicionismo deve ser pauta reivindicatória do povo oprimido, junto à descriminalização e a auto-organização do cultivo. Não basta deixar de ser crime o porte e o cultivo da maconha, assim como não bastará arrancar o status legal da planta perante o estado, o auto-cultivo pessoal e cooperativo autônomo (sem a presença do estado) deve ser diferencial importante, contra apropriação do estado e do mercado. Reivindicações que significam conquistas de maneiras específicas, e que acima de tudo fazem parte de um projeto revolucionário que só se completará com o fim do sistema capitalista.

Avante na construção de uma frente de luta antiproibicionista anarquista!
A guerra às drogas é uma fraude!
Para nós a luta antiproibicionista não é pauta secundária!
Lutar pela descriminalização das drogas é lutar pela nossa vida!

Marcha da Maconha
Fortaleza, 28 de maio de 2017.

Organização Resistência Libertária [ORL]
Coordenação Anarquista Brasileira [CAB]

fev 052015
 

SOBRE A POLÍTICA ARCAICA DE COMBATE ÀS DROGAS

“A marcha fúnebre prossegue”

Facção Central

Secretarias, órgãos e instituições do Estado apresentam um discurso único na mídia corporativa e repetem constantemente que combaterão as drogas em 2015. Os deputados e o atual governador do Estado prometeram um plano de segurança ostensivo: mais polícia na rua, mais esquadrão Raio, construção de novos presídios, diálogo com as forças repressivas e o aumento de equipamentos para a repressão.

Tanto a direita quanto a esquerda parlamentar apresentaram seus planos de segurança na farsa eleitoral do ano passado. A esquerda eleitoral, com seu reformismo, apresentou um fajuto modelo em que o consumo de determinadas drogas seria controlada pelo Estado. Distribuição e consumo controlados pelo Estado? E o livre arbítrio para produções coletivas e domésticas de autoconsumo? É… fazem parte do programa dos partidos diversas formas de controle social. Parece ser uma pauta avançada, mas a intervenção estatal sempre visará controlar e vigiar os passos do povo.

Na realidade, este combate às drogas vem associado ao massacre da juventude periférica e pobre, em sua maioria negra. A tradução desse discurso no cotidiano é a criação de “zonas de extermínio”. Essas zonas estão na periferia, áreas sem bibliotecas, sem uma real formação para a vida, sem uma articulação entre os serviços sociais básicos e com altos índices de desemprego formal. Isso implica uma juventude sem acesso a serviços essenciais, sem uma renda satisfatória para manter as necessidades mais básicas.

A única coisa que chega a qualquer horário batendo à porta dessa parcela da população é a repressão. A principal violência em nossa sociedade é a do Estado! Essa juventude é chamada de vagabunda por muitos “especialistas” da (des)segurança pública, e os referidos vagabundos, na concepção dos “especialistas”, seriam aquela parcela matável. Essa propaganda aparece todos os dias nos programas policiais sensacionalistas, programas que são patrocinados por empresas de segurança, bebidas alcoólicas e funerárias. A ligação entre mídia e patrocinadores movimenta um verdadeiro mercado do terror.

Vivemos uma guerra não declarada, em que a pena de morte é a punição para quem não se adequa ao sistema. Nossa sociedade é concorrencial e excludente, e esses pilares do capitalismo são cartas fundamentais para nossa divisão. Assim, “no jogo do sistema é favelado versus favelado”, como diria nossos companheiros do Apologia do Gueto.

Muitos, quando falam em extermínio da juventude, gostam de apresentar dados sobre homicídios e acabam omitindo que o Estado contribui diariamente de outras maneiras para o extermínio da juventude pobre e negra. Eles omitem que os precários serviços sociais é que o verdadeiro extermínio, em que o posto de saúde fica sempre lotado, o transporte coletivo é sucateado e caríssimo, as unidades de “internação” para a juventude em conflito com a “lei” são superlotadas e o direito ao Ensino Superior para a maioria da periferia é negado pela “porta” do vestibular (SISU).

A solução apresentada pelo governo do Estado em conjunto com as forças repressivas é a criação de uma Secretaria de Combate às Drogas, que na prática já se vislumbra que será um combate a uma juventude que não teve direito algum durante sua vida. Será um combate a quem tem falta de quase tudo no cotidiano. É a visão arcaica e falida de sempre aumentar a repressão. Os cerca de 18 mil homens da polícia militar (PM) do Estado terão carta branca para ações mais truculentas.

Paralelo a isso, números e mais números são apresentados. Na Educação, o governo Dilma acaba de colocar um Ministro da Educação cearense. O mesmo que entrou com ações no STF para barrar a Lei do Piso Nacional do Magistério e que reprimiu violentamente as professoras e os professores na última greve do Magistério estadual cearense (2011). Eles propagandeiam os mais de 90% de alunos matriculados na escola básica. Isso não diz muita coisa, isso demonstra a hipocrisia do Estado e só ajuda a esconder a miséria da educação nesse estado e nesse país. Qual a função da escola cada vez mais tecnicista na atualidade? Qual a lógica das escolas “profissionalizantes”? Perguntas que respondemos simplesmente afirmando que a Escola mantém, como sempre manteve, sua função de apenas formar seres utilizáveis para o mercado e obedientes ao Estado.

O LADO SUL DA REGIÃO METROPOLITANA (RM)

[…] quem é que vai morrer por aqui não tem dublê, o roteiro é macabro o protagonista é você […] Apologia do Gueto

Crianças e adolescentes aumentam os números das estatísticas sobre violência em nosso Estado, mas a violência da desigualdade não é discutida, simplesmente se naturaliza. A violência estatal não entra na estatística. As mortes que ocorrem em presídios, nas filas de hospitais, no campo e nas fábricas dificilmente são relatadas pelo Estado. Se falarmos em homicídios, segundo o Mapa da Violência de 2012, Maracanaú e Fortaleza disputam o primeiro lugar em termos de homicídios para cada 100 mil crianças e adolescentes. Em números absolutos, Fortaleza ocupou a sexta posição e Maracanaú a 23ª colocação numa lista das 100 cidades com as maiores taxas de homicídio do Brasil. Muitos são os jovens que não aparecem nessa estatística, simplesmente somem de um dia para o outro. Ninguém sabe o que realmente ocorre dentro das unidades de “internação” para os jovens em conflito com a “lei”. Há também aqueles que passam por tortura, não suportam as sequelas e cometem suicídio.

No Maracanaú, assim como em outras cidades, a corrupção faz parte das estruturas de poder. A corrupção é intrínseca ao sistema capitalista. Ela permeia todas as instituições do sistema, inclusive, é claro, a policial. Não é apenas uma questão de “baixos rendimentos” que faz com que atos corruptos surjam entre os policiais. O que podemos esperar de quem tem a função de reprimir o povo que já é super explorado pelos patrões e governos? O que podemos esperar dos que ganham semanalmente uma “gorjeta” fazendo a RONDA nas propriedades privadas? Que o digam os postos de combustíveis e os grandes estabelecimentos…

O bairro do Conjunto Timbó, em Maracanaú, foi constituído por famílias vindas das diversas áreas periféricas de Fortaleza. Historicamente, a comunidade do Timbó teve e tem seu solo manchado por sangue, já passou por diversas ocupações e é um dos locais preferidos para “desova” de corpos. A ação policial (militar e civil) sempre foi truculenta e abusiva no bairro, principalmente com a juventude, e, em grande medida, as desovas (nas margens do Rio Timbó) foram realizadas por esses repressores. No Timbó faltam espaços para o desenvolvimento de arte e cultura no bairro. Nosso esgoto é jogado diariamente em um dos afluentes do Rio Cocó, as mazelas provocadas pelo sistema de dominação em que sobrevivemos estão presentes diariamente em nosso meio.

De meados de dezembro de 2014 até as primeiras semanas de janeiro de 2015, três foram as mortes ocorridas no Timbó. Tiros, conflitos, polícia e o chão vermelho de sangue, praticamente uma morte por semana. Cotidiano suicida é o que uma sociedade desigual traz. Mortes não desvendadas são comuns, mas não devemos achar normal tal situação, achar que é menos um e mais nada. As relações de dominação e as estruturas de poder precisam ser compreendidas. Precisamos nos organizar e entender que a justiça não é lenta, e sim burguesa e tenderá sempre para um lado. Foram três homens, três histórias, três seres humanos, vidas! Mulheres sofrem: mães, irmãs e namoradas que passam por situações vexatórias nos presídios em dias de visita.

O policiamento faz seus acertos e sabe a hora de jogar fogo nos conflitos. Há uma relação estreita com o tráfico e os acordos e a extorsão nas madrugadas são comuns. O mercado das armas corre solto. Quem vende as armas para a juventude periférica?

Nas favelas, policiais apreendem drogas e armas para revendê-las aos próprios traficantes e, depois de matá-los, as vendem novamente. Nenhum governo (mesmo um de “esquerda”), desde a ditadura, tem se preocupado com este processo, ao contrário, tem o levado cada vez mais ao extremo. E muitos partidos de esquerda defendem a ideia absurda da possibilidade de uma polícia cidadã! Uma polícia que não reprima os pobres é um sonho absurdo dentro do capitalismo (FARJ, Da periferia aos centros e de volta a periferia: Chacina da Maré, 2013).

Além do extermínio vindo do lado da repressão, a juventude periférica pobre e negra está se destruindo entre si. Grupos rivais a cada dia aumentam seu arsenal. Se a polícia tem conflito com um grupo, acaba munindo outro grupo para dar continuidade à guerra na periferia. Assim, não é difícil saber de onde vem a pistola Ponto 40.

A nossa arma deve ser apontada para o lado certo e para o verdadeiro inimigo, o sistema. A periferia deve se unir e utilizar seu potencial para auto-organizações combativas e revolucionárias. Os trilhos da transformação devem ser seguidos e o lado sul da Região Metropolitana deve ser linha de frente nesse processo. As PEDRAS no meio do caminho não devem ser retiradas por retirar, elas devem servir de munição para os alicerces da igualdade!

“A campanha pede o desarmamento da periferia
Só que os calibre letais protegem a burguesia”.

Eduardo, A fantástica fábrica de cadáver

“Será mais nobre suportar a injustiça moderadamente ou pegar armas para se contrapor à injustiça? Eu fico com a segunda. Se você pegar em armas, você acaba com ela. Mas se esperar os poderosos acabarem com a injustiça, vai esperar muito tempo. […]Vou me unir com qualquer um, de qualquer cor, desde que você queira mudar a miséria desta terra.”

Malcom X