Direto do site da FEDERAÇÃO ANARQUISTA GAÚCHA – FAG· SEXTA, 10 DE NOVEMBRO DE 2017
Uma comissão especial da câmara dos deputados, aprovou nesta quarta, dia 8, um forte endurecimento contra a lei de aborto no país. A lei de aborto que até agora, entendia os casos de riscos a vida da mulher, estupros e anencéfalos como prática não criminosa, porque busca preservar a vida da mulher e evitar piores traumas futuros, pode ser mudada. A comissão especial da câmara, que é composta por uma maioria da bancada evangélica, todos homens, resolveram aprovar uma emenda que altera a constituição e que proíbe a prática de aborto até em casos de estupros. Consagrando assim, um legado, cada vez mais crescente, de criminalização dos corpos, de suas sexualidades, em especial agora, o corpo da mulher.
Esta ‘inquisitora’ comissão especial, foi instalada em uma briga, como retaliação ao Supremo Tribunal Federal, que considerou aborto ate os 3 meses de gestação não crime. Seguindo o exemplo de vários países no mundo que avançaram nos direitos sobre a vida e os corpos das mulheres.
No entanto, os evangélicos não medem esforços para mostrar toda a força que tem dentro do parlamento burguês brasileiro. E, o discurso charlatão conservador ganhou pérolas na votação de quarta feira, com destaque para o deputado pastor Eurico (PHS/PE) que em meio a sessão gritava segurando uma replica de um feto de 12 semanas nas mãos, as seguintes palavras “ Onde esta o amor as mulheres? Onde esta o amor as crianças? Isso não tem nada a ver com religião, isso é uma posição! Nós somos contra o assassinato em massas de inocentes.”
Não é de hoje que assistimos os discursos mais conservadores do país ganhando cena e poder político. Estes grupos não são apenas aceitas dogmáticas, manipuladores da fé das pessoas, ultra disciplinador de corpos, mas, são também uma prática autoritária, completamente intolerante. Terreiros de Umbanda foram diversas vezes atacados, os seguidores das religiões africanas sofrem perseguições e agressões de toda sorte por parte dos “seguidores de deus”. Eles destroem outras igrejas. Também construíram o “exercito de deus”, onde centenas de jovens se alistam para combater na porrada em nome sua fé e somente sua fé. Porém, não nos enganamos que sejam apenas alguns fanáticos manipuladores dos anseios e sofrimentos das pessoas, são um grupo com grandes interesses políticos no país, são donos de grandes fortunas, são donos de canais televisivos, de rádios e jornais. São a maior bancada do congresso nacional, são grandes sonegadores e ladrões do povo mais oprimido, em nome do “sagrado dizimo”. São eles que, pelo seus meios de comunicação de grande alcance, principalmente entre a população mais pobre, detonam discurso contra a liberdade das mulheres cotidianamente, discursos onde submissão é um valor e a dominação do homem é incentivada. O discurso patriarcal, homofóbico e intolerante são os valores que esta instituição político religiosa propaga todos os dias e é claro que vão fazer com que estas ideias se tornem fatos consumados. Mas, não antes de enfrentar a nossa Resistência!
A narrativa conservadora em voga no país, de norte a sul, tem feitos mais vitimas mulheres de abusos que circulam como propaganda a toda conduta machista. São casos de estupros coletivos, feminicídios que assombram nossas vidas, homens que ejaculam em mulheres em transportes públicos, entre outras crueldades de assédios cotidianos. A ideologia destes setores conservadores tem se tornado mais influente, começam a disputar, para destruir, qualquer avanço nas liberdades sociais, individuais e sexuais. Não a toa, esta campanha contra as “ideologias de gênero”, de “escola sem partido”, entre outras sandices que acumulam liberais e conservadores na mesma medida.
Os grupos de extrema direita estão atuando para combater não só ideologicamente, mas como também, fisicamente seus adversários e opositores. Cumprem as mais diferentes ameaças em espaços públicos, palestras, atos e universidades, só esperam o melhor cenário para atuar. Praticam a intolerância e conseguem, através do escracho, impedir a mostra “Queer museu” em Porto Alegre. Mesmo sendo eles um dos grupos mais denunciados, por praticarem pedofilia e estupro contra crianças (meninas e meninos). São os mesmos, que queimam bonecos de bruxas na palestra de Judith Butler, acabam com aulas sobre feminismo, de temas socialistas, etc. São herdeiros dos antigos senhores da Casa Grande, que estupravam suas escravas e as obrigavam a ter os filhos bastardos, herdeiros e reprodutores da colonização do corpo da mulher.
Eles, que jogam nas redes sociais os discursos de ódios mais absurdos como se fossem dizer apenas “bom dia”. Propagandeiam condutas fascistas sem nenhum problema e enquanto isso os governos e suas policias seguem exterminando os pobres, perseguindo os movimentos populares, libertários e agora criminalizam as mulheres.
Somente nos organismos de base, longe da política de gabinete, com as mulheres do povo oprimido que vamos poder cultivar a resistência contra o sistema machista e opressor!
Nós, como anarquistas não temos confiança nenhuma nas instituições parlamentares, nem nas estruturas do Estado. Sabemos que todos os governos são comprometidos com projetos que não estão dispostos a direitos e liberdades das pessoas. A não ser, seus direitos e liberdades enquanto elite de dominação. Nem os governos ditos de esquerda avançaram sobre as demandas do movimentos feminista, nem de todas as demais demandas do povo oprimido, não seria agora que se avançaria. Ainda mais dentro de uma conjuntura de ajustes e extremamente repressiva como esta.
É preciso ligar o alerta e demonstrar força de mobilização contra a PEC 181, construir ampla campanha contra ajuste, as amarras que querem impor as mulheres brasileiras.
Mais de 50 mil mulheres morrem por ano no Brasil, a cada 9 minutos uma, todas vitimas de abortos clandestinos.
Precisamos, mais do que nada, difundir a realidade sobre o tema aborto, pois o “massacre em massa” que existe hoje é o das milhares de brasileiras pobres e negras das periferias. Não precisamos ir longe para desmascarar o discurso conservador, seguramente os mesmos são capazes de reconhecer, entre eles, que para as mulheres com melhores condições econômicas, as mulheres e filhas das elites, estas são as primeiras a fazerem o procedimento do aborto sem grandes riscos, nem o penal. Ou será que nenhuma filha, parente, conhecida dos pastores em questão, nunca tiveram que passar por isso? Será mesmo que nenhum destes pastores já não pagou caro pra que suas familiares não “sujarem” sua honra, engravidando de genros indesejados? Ou mais do que isso, já não obrigou estas mulheres a ter o filho, mesmo contra vontade arranjando casamentos forçados?
As pobres sim são as vítimas diretas desse massacre, da ausência de políticas publicas, de políticas de saúde para as mulheres. São as mulheres das periferias que acumulam seus corpos sem vida diante da opressão machista que tenta nos ajustar como objeto de controle. Violam toda a liberdade, a autonomia e a vontade da sujeita/o ser autora primeira sobre seu corpo, de ter direitos garantidos sobre sua vida. Mais uma vez a liberdade das mulheres passa a ser decidida por um grupo de meia dúzia e mais alguns engravatados, que falam em nosso nome.
A luta das mulheres precisa ganhar as ruas mais uma vez, fazer o que historicamente nos tocou fazer, lutar. Lutar porque são nossas filhas, netas, irmãs, mães, primas, sobrinhas, tias, vizinhas, amigas, nós mulheres que vamos pagar com vidas pelo discurso criminalizador do nosso corpo. Nenhum Estado ou governo, pode decidir em nosso nome, somos nós que sofremos a dor da perta de nossas familiares, somos nós que carregamos os traumas de uma gravidez indesejada, somos nós mulheres que cultivamos um luto sozinhas, arriscando a vida porque nosso corpo e somente ele, tem funções que ganham as mais severas punições, o dos homens não.
Nenhuma gravata vai decidir por nós! Ampliar a luta contra a PEC 181 e toda a onda machista, homofóbica e conservadora sobre o país.
Nós mulheres anarquistas nos colocamos do lado de todo movimento feminista classista que vai sair as ruas para lutar contra este terrível retrocesso sobre nossas vidas e, nossas demandas históricas de direitos e liberdade.
Acreditamos que é importante comprometer todos os movimentos populares, nossas frentes de luta a estarem em solidariedade as nós mulheres. É hora de lutar contra o ajuste político-econômico, assim como contra o ajuste do corpo da mulher. Que o protagonismo seja das mulheres de baixo, porque são elas, nós, que pagamos o preço de uma cultura ódio contra a pobreza e o direito de decidir sobre nossas vidas.
Não se ajusta a mulher que peleia! Nenhuma a menos! Nós decidimos!