abr 262012
 

 

Nota do Movimento de Luta em Defesa da Moradia (MLDM) sobre as alterações no projeto do VLT Parangaba-Mucuripe

No último dia 12 de março, o Metrofor divulgou em sua página mudanças no projeto do VLT Parangaba-Mucuripe. A mudança mais significativa refere-se à nova localização da estação no Bairro de Fátima, que inicialmente seria implantada ao lado da Rodoviária Engenheiro João Tomé, em cima da comunidade Aldaci Barbosa, provocando a remoção de cerca de 250 famílias (segundo o Metrofor).

Com a alteração do projeto, a estação será construída numa área em frente à antiga localização, entre a Av. Borges de Melo e a Rua Francisco Lorda, reduzindo o número de imóveis atingidos nesta localidade, pela estação, para aproximadamente 20.

Ainda de acordo com o Metrofor, devido a outras alterações no projeto, estaria prevista uma redução no número total de famílias atingidas pelo VLT de aproximadamente 2.500 para 1.700.

Cid Gomes expulso da Aldaci Barbosa[1]

A comunidade Aldaci Barbosa foi uma das primeiras a resistir contra as remoções do VLT e até hoje tem se negado a colaborar com o governo. Por conta disso, no dia 02 de agosto de 2011, o governador Cid Gomes fez uma “visita” a noite e sem aviso prévio à comunidade, com o intuito de pressionar os moradores a aceitarem a remoção. Acompanhado de secretários, assessores e um batalhão de seguranças (até o comandante-geral do Polícia Militar estava lá!), Cid tentou percorrer casa por casa, conversando com moradores a portas fechadas. Mas a tentativa de intimidação pegando a comunidade desprevenida virou um verdadeiro vexame! Não demorou muito e moradores de outras comunidades ameaçadas pelo VLT, militantes de organizações políticas e de movimentos sociais se uniram aos moradores da Aldaci. Diversos meios de comunicação cobriram Cid Gomes sendo expulso da comunidade de forma humilhante, sob uma chuva de vaias e aos gritos de “terrorista” e “ditador, respeite o morador!”

A resistência das comunidades foi o determinante!

As alterações no projeto do VLT não podem ser entendidas como um ato de benevolência do governo de Cid Gomes. Pelo contrário, a resistência das comunidades foi o determinante!

Desde que souberam da ameaça de remoção, no início de 2010, teve início um processo de organização e articulação de moradores das comunidades do entorno do ramal Parangaba-Mucuripe. Em alguns trechos, conseguiram impedir a ação das terceirizadas, não permitindo o cadastramento das famílias nem a marcação e avaliação dos imóveis (situação que persiste até hoje). Inúmeras assembleias, reuniões, protestos, debates e outras atividades dentro e fora das comunidades foram realizadas. A articulação de moradores e apoiadores resultou na formação do Movimento de Luta em Defesa da Moradia (MLDM), que tem assumido a dianteira na luta contra as remoções.

Toda essa movimentação foi decisiva para tornar pública a situação, com a mídia local e até nacional veiculando constantemente matérias sobre a problemática das remoções.

Mudanças emergenciais: a corrida contra o tempo e a Copa de 2014

Outro recurso utilizado pelo MLDM tem sido buscar o apoio do Ministério Público Federal e das Defensorias Púbicas, o que resultou em recomendações e ações judiciais. Em decorrência disso, durante meses o governo foi impedido de realizar qualquer ato desapropriatório referente à implantação do VLT. O resultado de uma das ultimas ações foi o impedimento do inicio das obras em áreas onde estejam previstas remoções antes que seja dada uma solução definitiva para a questão habitacional para a população desses locais.

Diante desse impedimento, a solução buscada pelo governo para acelerar a implantação do VLT foi, por um lado, substituir um local de remoção por outro onde supostamente estas não serão necessárias (caso da Aldaci Barbosa). Por outro lado, foi necessário diminuir o tamanho de algumas estações e alterar pontos do trajeto para diminuir a quantidade de reassentamentos (de 2.500 para 1.700, segundo o Metrofor). Como o projeto inicial previa remoções em quase 70% do percurso, isso emperraria a obra em sua maior parte, com o ritmo subordinado ao da “resolução da questão habitacional”. Diminuindo o número de removidos é possível acelerar o tempo necessário para os reassentamentos e adiantar o andamento das obras.

A resistência das comunidades tem sido decisiva para o enorme atraso na implantação do VLT. O prazo inicial previsto na Matriz de Responsabilidades[2] era de 30 meses (de janeiro de 2011 a junho de 2013). Depois disso foram anunciados pelo menos 5 datas diferentes. Já o edital de Licitação do VLT define um prazo de 18 meses[3] para que o consórcio vencedor finalize a implantação do empreendimento. A contar de abril de 2012, quando tiveram inicio as primeiras intervenções, o atraso já inviabiliza que o trensinho fique pronto para a Copa das Confederações, em junho de 2013. Para tentar evitar o risco de não tê-lo para 2014, o governo do Ceará foi obrigado a alterar o projeto.

A luta não vai parar aqui!

Não resta dúvidas que a diminuição dos impactos sobre a população residente no entorno do trilho deve ser considerada uma conquista (e não uma dádiva!) para as comunidades e o Movimento. No entanto, a luta ainda está longe de terminar, visto que:

1. O número de remoções permanece absurdamente alto (1.700 segundo o Metrofor) e consideramos de fundamental importância que sejam exploradas outras alterações no projeto, sobretudo referentes ao traçado, que podem reduzir drasticamente o número de remoções;

2. Consideramos o plano de reassentamento do governo completamente inadequado, visto que desconsidera a existência de terrenos no entorno das comunidades, pretendendo realocar as famílias em conjuntos habitacionais nos limites de Fortaleza (no José Walter e na Paupina), sem garantias de equipamentos e serviços sociais suficientes (escolas, creches, hospitais, postos de saúde, igrejas, etc.), provocando danos socioeconômicos de grande proporção para famílias de baixa renda, como a impossibilidade de trabalho e renda, já que no caso das famílias do VLT, isso depende diretamente do local de moradia (muitos são pescadores, trabalham nos prédios ao lado como diaristas, babás e outros serviços, nas lojas do entorno, como ambulantes na praia, nos restaurantes, etc.). Por tanto, depois de exploradas novas alterações no traçado, persistindo os casos de reassentamentos, devem ser consideradas todas as possibilidades de realizá-los no entorno das comunidades, em condições adequadas de moradia e com direito de participação e decisão efetivos da população atingida na elaboração do plano habitacional;

Persiste a insegurança das famílias em relação ao valor extremamente baixo das indenizações. O aluguel social (R$ 200), que além de completamente insuficiente para custear condições adequadas de moradia, revela-se na prática um recurso perverso, pois costuma postergar-se por tempo excessivo, gerando uma situação extrema de vulnerabilidade para as famílias. Com a necessidade de acelerar a implantação do VLT, tememos que o governo do Estado faça uso excessivo do aluguel social, por meio do rebaixamento forçado das indenizações (imóveis avaliados em até R$ 16.000 dão “direito” ao aluguel social), o que lhe permitiria postergar os reassentamentos, estendendo por tempo indefinido o martírio dos removidos.

Por fim, nós sempre insistimos na necessidade e na possibilidade de serem feitas alterações no projeto do VLT que eliminassem ou reduzissem drasticamente os impactos sobre a população residente no entorno do trilho. O governo do Estado do Ceará, por sua vez, quando não se fazia de mouco, lançava alegações supostamente técnicas que impossibilitavam ditas alterações (e só as fez quando esteve diante de alguma ameaça!). Hoje, tendo que cumprir os prazos para a Copa do Mundo, demonstra-se mais uma vez que as impossibilidades foram sempre de outra ordem, pois consistem em conciliar um projeto de mobilidade urbana à política de higienização social em uma área de farto interesse econômico (comercial, imobiliário e turístico) em Fortaleza.

QUANDO OS DE BAIXO SE MEXEM, OS DE CIMA BALANÇAM!!

Fortaleza, 15 de abril de 2012.

Movimento de Luta de Defesa da Moradia (MLDM)


[1] http://www.youtube.com/watch?v=gB65T_-Z62Q

[2] Documento firmado em 13 de janeiro de 2010 entre Governo Federal, 11 prefeitos e 12 governadores (Brasília, uma das cidades-sede, não tem prefeito), definindo as responsabilidades (custos, prazos, fonte de recursos, executores) de cada ente federativo nas áreas de estádios, portos, aeroportos e mobilidade urbana para a Copa de 2014.

[3] De acordo com a (ANTU) Associação Nacional de Transporte Urbano, o tempo de implantação de um VLT a diesel é de 2 anos. Informação reproduzida pelo Metrofor in Projetos Baseados em Veículos Leves sobre Trilhos em Operação e Implantação – Projetos VLT. SEINFRA – Governo do Estado do Ceará, s/d.

 

 

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